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24 de set. de 2016

A INSUPORTÁVEL INÉRCIA DAS SANÇÕES AO USO DO DÓLAR EM TRANSAÇÕES MUNDIAIS COM CUBA

  #PELOFIMDOBLOQUEIO 
 #CubaVsBloqueo #YoVotoVsBloqueo #SolidaridadVsBloqueo

Um turista dos EUA desembarcando em Cuba. Foto: Ismael Francisco

Publicado originalmente no dia 26 de maio de 2016 em Www.cubadebate.cu

Kevin Darrow, dono de um pequeno restaurante em Pasadena, chegou a Havana no dia 24 de Maio deste ano. Vindo com uma licença total que lhe permite o intercâmbio "povo a povo" e com o entusiasmo de quem desembarca em um país exótico, agora, na moda nos Estados Unidos. No aeroporto, prestes a embarcar em um ônibus que o levaria ao Hotel Melía Cohiba, reconheceu ao CubaDebate que é incômodo estar longe de casa sem poder usar cheques de viagem e cartões de crédito, e, portanto, efetivamente com todo o dinheiro no bolso.

"Sabe por que isso acontece?", lhe pergunto. "Não, só me disseram que tinha que ser em dinheiro, porque os cartões de crédito não funcionam aqui". Tem escutado falar de "embargo" (bloqueio para os cubanos), mas não sabe como uma coisa se relaciona a outra. Também não sabia que o presidente Barack Obama havia autorizado em março o uso do dólar nas transações entre os dois países, nem que os cubanos podem realizar transferência de fundos nessa moeda em contas fora dos Estados Unidos, que cheguem a Cuba e tenham como destino final bancos situados fora do território estadumidense (chamadas de transação "U-turn").

Kevin Darrow não sabia e, aparentemente, também não foi informado por bancos estadunidenses. Como CubaDebate recordou recentemente, a ilha mão tem podido realizar qualquer operação bancária em dólar desde a entrada em vigor da medida, em 17 de Março de 2016, até hoje. E, como sabemos, como a maioria das operações em dólar transitam através de bancos estadunidenses, a proibição de tais transações tem afetado severamente a economia do país.

Na véspera da visita do presidente Barack Obama a Havana, um dia depois de se tornar efetiva a permissão de operar essa moeda, o ministro das Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodriguez Parrilla disse que Cuba deixaria de aplicar o imposto de 10% ao dólar na sua entrada no país, mas apenas quando se comprovar que realmente não há perseguição contra as transações financeiras cubanas nessa moeda.

Seguros

A Kevin não só o preocupa ter que trazer o dinheiro no bolso, mas não tem ideia de como poderiam funcionar seus seguros de saúde, viagem e vida. Ele pagou o seguro de saúde na ilha, se tiver um problema, sabe o hospital que deve ir para ser atendido. O comprou com o bilhete de avião, mas teria gostado de fazer através de sua seguradora da vida toda nos Estados Unidos, como faz quando viaja a outros países. Não foi possível e não pode explicar claramente as razões.

De acordo com as medidas aprovadas no primeiro pacote de Obama, em março 2015, as companhias de seguros dos Estados Unidos podem assegurar os seus viajantes que chegam a Cuba. "As regras do Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC), do Departamento do Tesouro, não impedem a uma companhia de seguros estadunidense assegure os viajantes que têm permissão para viajar a Cuba. Mas talvez as companhias de seguros não saibam", confirmou por telefone ao CubaDebate o advogado estadunidense Michael Krinsky, que representa o governo cubano nos Estados Unidos.

Normalmente a Empresa de Seguros Internacional de Cuba, SA (ESICUBA), prestar assistência aos viajantes internacionais por meio de acordos com outras empresas do mesmo ramo no mundo, mas historicamente tem enfrentado restrições para adquirir proteções de resseguro, não só com empresas estadunidenses, mas com empresas de outros países que têm interesses norte-americanos ou ações em bolsas dos Estados Unidos, principalmente na NYSE.

Com as seguradoras corre o mesmo que com os bancos. As autorizações existem, mas existe o medo de dar o primeiro passo. E faz sentido. O governo dos EUA tem imposto multas colossais a bancos em de outros países aplicando sanções do bloqueio, que tem tido um efeito imensamente doutrinador. São conhecidas no setor as sanções ao banco UBS de 100 milhões de dólares; ao Credit Suisse, de 536 milhões de dólares; ao BNP Paribas, com um super encargo de 8,83 bilhões de dólares.

A política de perseguição financeira contra bancos de outros países, que são impedidos de negociar com Cuba, tem gerado apenas nos últimos três anos multas de mais de dez bilhões. Em 2014, após o anúncio histórico dos presidentes Raúl Castro e Barack Obama, que abriu caminho para iniciar o processo de normalização das relações entre os dois países, o banco francês Crédit Agricole foi multado em 787 milhões de dólares. Ao menos meia dúzia de outros bancos foram multados em quantidades menores, e dezenas de outros foram objeto de investigação.

Porém o que se sabe não é necessariamente o que está acontecendo na realidade. Muitas multas não chegam a virar notícia, porque as administrações dos bancos cuidam para não criar pânico em sua clientela. Nem todos podem se recuperar facilmente de uma carga de milhões de dólares.

Uma cidadã estadunidense chegando ao Aeroporto Internacional José Martí, em Havana Foto: Ismael Francisco Eiras
 A inércia de uma medida draconiana

"O objetivo desta aplicação draconiana é dissuadir os bancos de realizarem negócios com Cuba, tornando os custos tão altos que eles não se atrevam a assumir o risco. Funcionou muito bem", reconhece em um artigo para o World Politics Review o pesquisador William Leogrande, coautor de um livro indispensável para a entender as relações Cuba-EUA, " Back Channel to Cuba: A História Secreta das Negociações entre Washington e Havana ".

Leogrande recorda que o primeiro sinal de que as sanções financeiras haviam feito metástase fora do controlo do Departamento do Tesouro veio em 2013, quando o Banco M&T se recusou a continuar dando seus serviços à missão diplomática de Cuba em Washington, porque que os custos para isso eram superiores aos benefícios. "Custou ao Departamento de Estado 21 meses para encontrar um banco disposto a substituir o M&T. Finalmente, o Banco Stonegate concordou em fazê-lo em julho de 2015 porque, como disse seu CEO, sentiu uma "obrigação moral" de ajudar a restabelecer as relações entre os dois países ".

E, obviamente, tinha forte apoio do governo para nos adicionar. Algo que também aconteceu em outras ocasiões, segundo reconheceu o principal assessor em política externa de Obama, Ben Rhodes. Em um diálogo em que participou com Cubadebate, Rhodes assegurou que para cumprir o seu compromisso de fazer uso efetivo do dólar em transações cubanas, a administração iria "aos bancos para estabelecer um diálogo com eles e explicar: um, que já é permitido este tipo de transação e dois, que eles não vão enfrentar qualquer tipo de penalidade se tomarem esta medida. "

Ben Rhodes acrescentou que a inércia das sanções aplicadas por tanto tempo provocou não só uma questão de medo e preconceito, mas que os bancos estadunidenses têm seus computadores programados para rejeitar transações com Cuba. A inércia estende-se a máquinas e têm ocorrido absurdos como o fechamento automático de contas para clientes que usaram o seu cartão de crédito para comprar um bilhete para uma peça de teatro em cujo título apareça a palavra "Cuba".

"Os bancos estão muito nervoso sobre qualquer passo em falso ... pelas multas, mesmo quando se trata apenas de um pequeno erro, elas podem ser enormes", explicou à Reuters um advogado de Miami envolvido no sistema bancário internacional. "É mais fácil impor sanções que desmantelá-las", admite um funcionário dos EUA citado pela agência britânica.

O extraordinário é que, enquanto autoridades dos EUA mostram interesse em desbloquear operações, ao mesmo tempo se contradizem em suas ações. O Secretário de Estado John Kerry se reuniu no início deste mês com representantes dos principais bancos europeus para dar garantias de que eles podem negociar. Josefina Vidal, diretora-geral dos Estados Unidos no Ministério das Relações Exteriores de Cuba, numa conferência de imprensa mostrou, com toda razão, a sua enorme surpresa em relação a esta ação do Secretário de Estado, exatamente quando estava por ocorrer em Havana a terceira reunião da Comissão bilateral Cuba-EUA.

"Não houve nenhum esforço diplomático comparável para tranquilizar os bancos para que as sanções sejam realmente levantadas", admite Leogrande. O vice-diretor do Ministério das Relações Exteriores de Cuba, Gustavo Machín, comentou sobre isso em uma conferência de imprensa que aconteceu, por sinal, antes da reunião de Kerry com os bancos europeus:

"Cuba tem insistido em que não é só anunciar a medida de autorização do uso do dólar nas transações internacionais, abertura nas transações internacionais, mas sim que esta medida deve estar acompanhada, como nós temos insistido, de uma declaração forte, uma declaração política ou mesmo um documento legal que dê garantias aos bancos de que, por se envolverem com Cuba, não serão punidos."

Isso não tem acontecido até agora publicamente e, portanto, explica por que o amigo Darrow passa por tal desconforto em sua viagem à Ilha, como acontece a cada compatriota que está desembarcando aqui. Enquanto isso, do lado de cá, 11 milhões de cubanos também esperam que sua economia se liberte da perseguição irracional do dólar, a moeda suprem para as operações em moeda estrangeira. Não é justo.

  Fonte: cubadebate

                                                                 VENCEREMOS !!!

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