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11 de set. de 2018

Eduardo Galeano fala sobre Cuba








Eduardo Galeano

Nunca confundi Cuba com o paraíso. Por que vou confundi-la, agora, com o inferno?


Eu sou um mais dentre os que achamos que é possível amá-la sem mentir nem calar. 

Faz mais de CINQUENTA anos que o veto imperial se aplica de mil maneiras, para impedir a realização do projeto da Sierra Maestra.

Em Cuba, democracia e socialismo nasceram para ser dois nomes da mesma coisa; mas os donos do mundo só outorgam a liberdade de eleger entre o capitalismo e o capitalismo.

O modelo do leste europeu, que tão facilmente se derrubou lá, não é a Revolução Cubana. A Revolução Cubana, que não chegou de cima nem se impôs de fora cresceu a partir do povo e não contra ele, nem apesar dele. Isso  permitiu desenvolver uma consciência coletiva de Pátria: imprescindível autorrespeito que está na base da autodeterminação.

O bloqueio contra Cuba multiplicou-se com os anos. Um assunto bilateral? Assim dizem; mas ninguém ignora que o bloqueio norte-americano implica, hoje, em um bloqueio universal. A Cuba nega-se o pão e o sal e todo o restante. E também implica, ainda que o ignorem muitos, a negação do direito à autodeterminação. 

O cerco asfixiante em torno de Cuba é uma forma de intervenção, a mais feroz, a mais eficaz, em seus assuntos internos.

Em Cuba há mordomias? Mordomias do turismo? Sem dúvida. Mas o fato é que não existe sociedade mais igualitária na América. Reparte-se a pobreza: não há leite é verdade, mas o leite não falta para crianças nem para os velhos. A comida é pouca. Mas em plena crise segue tendo escolas e hospitais para todos o que não resulta fácil de imaginar em um continente onde tanta gente não tem outro professor que a rua, nem mais médico que a morte.
A pobreza reparte-se e reparte-se. Cuba segue sendo o país mais solidário do mundo. Cuba foi o único país que abriu as portas aos haitianos fugitivos da fome e da ditadura militar, que foram expulsos dos Estados Unidos. Julga-se Cuba como se não estivesse padecendo há mais de trinta anos, uma contínua situação de emergência.

 Astuto inimigo, sem dúvida, que condena as consequências de seus próprios atos.

A Cuba ditam-lhe cursos de direitos humanos que assobiam e olham para outro lado quando a pena de morte se aplica em outros da América e se aplica de vez em quando, senão de maneira sistemática: queimando negros nas cadeiras elétricas dos Estados Unidos, massacrando índios nas serras da Guatemala e metralhando meninos nas ruas do Brasil.
Deixa de ser admirável a incrível valentia desta ilha minúscula, condenada à solidão, em um mundo onde o servilismo é alta virtude ou prova de talento? Um mundo que não se vende, se aluga?
Fidel Castro é um símbolo de dignidade nacional. Para os latino-americanos, que já estamos cumprindo cinco séculos de humilhação, um símbolo único.



 11 setembro, 2018 Diário90 

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