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21 de jun. de 2023

COMO UM DOCUMENTO OFICIAL PODE CONTER TANTA HOSTILIDADE CONTRA UM POVO INOFENSIVO ? AQUI, A GÊNESE DO BLOQUEIO.

                                          

 Carmen Diniz*                             

     Para quem pensa que o criminoso bloqueio dos EUA contra Cuba começou com o ato em 3 de fevereiro de 1962 assinado pelo presidente John Kennedy, o famoso "memorando Mallory" prova o contrário. O período era o da presidência de Eisenhower e Lester Mallory atuava como Subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos. 

      O documento, datado de abril de 1960 , pouco mais de um ano depois do triunfo da Revolução Cubana em janeiro de 1959 serve para demonstrar, entre outras coisas, a paranóia ideológica estadunidense que continua até os dias de hoje. Cita a presença do 'perigoso comunismo' na ilha em um período em que sequer a ilha se enquadrava em tal sistema. Vale lembrar que a opção pelo socialismo só vai ser confirmada na criminosa invasão dos EUA e mercenários cubano-americanos em Playa Girón, em 1961, quando Fidel fala do caráter socialista da Revolução Cubana, aclamado naquele instante, pela população.

  A propósito, na  Baía dos Porcos (Playa Girón): a população cubana, armada, em poucas horas derrota os invasores contrarevolucionários poupando-os da morte e triocando-os por remédios e alimentos. 

  Voltando ao ano de 1960 na época do referido memorando (foto) a Revolução cubana fazia suas reformas sociais, sem nenhum caráter 'comunista' , o governo estadunidense se recusa a comprar o açúcar cubano (maior fonte de renda da ilha, na época) e vender petróleo . Se recusa, ainda, a refinar petróleo russo em suas refinarias da ilha. O governo cubano é forçado a nacionalizar bens e serviços estadunidenses com pagamento de indenizações que demais países recebem e  que o governo dos EUA se nega a receber. A partir daí e só aí passa Cuba a abolir o capitalismo de seu território.

     Em 1959, a principal fonte de recursos da ilha era a exportação de açúcar para os Estados Unidos e a sua fonte energética era, essencialmente, o petróleo importado daquele país.  Exatamente por isso, seguindo as diretrizes estabelecidas no memorando aqui presente, as duas primeiras medidas do governo estadunidense contra a ilha foram, já em 1960, ano seguinte ao do triunfo da Revolução, a redução drástica da importação do açúcar cubano e da exportação do petróleo para a ilha caribenha.

Assim é aqui se inicia o bloqueio: 

 O presidente dos EUA, Eisenhower, então, impôs a proibição de todas as exportações dos EUA para Cuba, exceto alimentos e remédios.*

          

Documento original conhecido como “memorando de Mallory” que foi levado ao presidente para assinar.
Reconhece que o povo cubano apoia a Revolução e que a estratégia deve ser asfixiar Cuba.

Tradução: 

SECRETO 

Este documento consiste em uma página

6 de abril de 1960 

Memorando para o Sr. Rubottom

Assunto:  O declínio e a queda de Castro


As considerações mais importantes a respeito da vida do atual governo de Cuba são

1 - A maioria dos cubanos apóia Castro (a estimativa mais baixa que vi é de 50%)

2 - Não há oposição política efetiva.

3 - Fidel Castro e outros membros do governo cubano defendem ou toleram a influência comunista.

4 - A influência comunista está permeando o governo e o corpo político em um ritmo incrivelmente rápido.

5 - A oposição militante a Castro de fora de Cuba só serviria à sua causa e à causa comunista.

6 - O único meio previsível de alienar o apoio interno é por meio do desencanto e do descontentamento baseados na insatisfação e nas dificuldades econômicas.

Se os itens acima forem aceitos ou não puderem ser combatidos com sucesso. Segue-se que todos os meios possíveis devem ser prontamente utilizados para enfraquecer a vida econômica de Cuba. Se tal política for adotada, deve ser o resultado de uma decisão positiva que exigiria uma linha de ação que, embora tão hábil e discreta quanto possível, faça as maiores incursões para negar dinheiro e suprimentos a Cuba, para diminuir os salários monetários e reais, para provocar fome, desespero e derrubada do governo.

O principal item em nossa arma econômica seria a autoridade flexível na legislação do açúcar. Isso precisa ser buscado com urgência. Da mesma forma, todos os outros caminhos devem ser explorados. Mas, primeiro, é necessário tomar uma decisão quanto à linha de nossa conduta. Você gostaria que essa proposta fosse preparada para o Secretário?  

                                                                                 Arquivo classificado (secreto)

Sim _assinado        Não____________________________

L.D. Mallory


 Lester Dewitt Mallory,
  Subsecretário de Estado em 1960

*Ainda assim se percebe a diferença da hostilidade atual do governo dos EUA contra Cuba: sequer durante a pandemia se admitiu que em Cuba entrassem ventiladores pulmonares para os pacientes graves acometidos de  Covid-19.

  Os termos utilizados no referido memorando impressionam por ser um documento de Estado, oficial e que se pode classificar como terrorista; trata-se de atos preparatórios por parte de um Estado com a finalidade de asfixiar economica e financeiramente toda uma população pelo fato de apoiar seu governo que não é palatável ao governo estadunidense.

     É este mesmo governo (Trump) que em uma lista unilateral e desonesta dos EUA inclui Cuba como um Estado supostamente apoiador de terrorismo (!?). Cuba, o país que mais sofreu atentados terroristas no mundo sem nunca ter atacado qualquer outro.

     O tal "memorando" nos ajuda a entender o porquê. Inserir Cuba na desonesta e imoral lista sabemos que se trata de "mais uma volta do parafuso" para intensificar ainda mais o criminoso bloqueio genocida que cada vez ampliam mais na ilusão de derrotarem um povo inteiro. A lista possui implicações comerciais e financeiras para dificultar cada vez mais a vida na Ilha. 

    O governo dos EUA pode derrotar um governo que não lhe agrade e a América Latina (e não só) já sentiu na pele isso muitas vezes. Não podem, no entanto, derrotar todo um povo.   Cuba não está só. 

                      O bloqueio continua? A solidariedade também

* Coordenadora do Capítulo Brasil do Comitê Internacional Paz, Justiça e Dignidade aos Povos

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