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23 de mai. de 2023

CUBA: A DÍVIDA MORAL DE BIDEN #Iroel

                                    

Atilio Borón 

    Escrevo estas linhas motivado pela dor que causou a tantos de nós o desaparecimento físico prematuro do intelectual, jornalista, guerreiro da informática e revolucionário cubano Iroel Sánchez Espinosa (foto) . O que segue é parte de uma conversa que tive com ele durante minha última visita a Cuba, em fevereiro deste ano. Conversamos sobre muitas coisas, é claro, mas não poderíamos deixar de falar sobre a política criminosa de Washington em relação a Cuba: o bloqueio econômico , comercial, financeiro, midiático; a perseguição ou chantagem de intelectuais, artistas ou figuras públicas e celebridades cubanas; o fenomenal cyberbullying desencadeado por várias fábricas de trolls de Miami; as dezenas de notícias falsas divulgadas diariamente para semear desânimo, confusão e raiva na população submetida aos duros rigores do bloqueio abrangente decretado pela Casa Branca há mais de sessenta anos. 

   Falamos também da hipocrisia e da cumplicidade das potências "democráticas" europeias, dessas decadentes ex-metrópoles coloniais hoje convertidas em submissos e indignos protetorados estadunidenses e muitas outras coisas. Recordando aquela longa e última conversa com Iroel esta manhã, senti que poderia processar melhor o luto causado por sua morte escrevendo minhas memórias daquele diálogo, como uma modesta homenagem à sua memória.

     Nessa conversa concluímos que o presidente Joe Biden deveria retirar Cuba sem demora da lista de países que patrocinam o terrorismo, uma decisão desonesta de seu antecessor, Donald Trump. Uma resolução infame, se é que existe, porque se algo caracterizou Cuba, é precisamente ter sido vítima do terrorismo promovido pela máfia anticastrista e colonialista entrincheirada em Miami, com seus personagens sombrios como Luis Posada Carriles, Orlando Bosch Ávilae seus capangas, todos gozando da proteção do FBI e da CIA atestados pelas mais diversas fontes oficiais dos Estados Unidos. E Cuba continua até hoje vítima de outro tipo de terrorismo, do qual pouco se fala, mas não menos criminoso por isso: o terrorismo econômico que se expressa no bloqueio abrangente imposto desde o início dos anos 1960 pelos Estados Unidos contra a Ilha rebelde em violação aberta dos direitos humanos e da Carta das Nações Unidas. O terrorismo das "sanções econômicas unilaterais" às quais às vezes se refere apelando a um eufemismo como a palavra "embargo" para não ter que usar o termo correspondente: bloqueio.

      Terrorismo, dizemos, porque segundo Richard Nephew-um dos teóricos e proponentes desta política e assessor por longos anos no Departamento de Estado- trata-se de infligir cirurgicamente o maior sofrimento possível às pessoas sancionadas de forma a provocar uma insurreição contra os governos que  não são do agrado de  Washington. Seu livro é intitulado por isso mesmo  "The Art of Sanctions" (Columbia University Press, 2018) e essa "arte" deve ser sublinhada: a arte de fazer o mal, de ferir, de causar sofrimento e, finalmente, de matar. Seu livro e seus conselhos  são o equivalente nesta época aos golpes suaves e legais ao que foram os manuais que a CIA distribuiu por toda a América Latina na década de 1970, instruindo os militares da região sobre as técnicas mais cruéis para torturar seus detidos e obter deles a tão almejada confissão .

    Apesar de tantas difamações e ataques fomentados pelo desejo doentio de Washington de tomar Cuba, Cuba tem o prestígio moral que falta aos Estados Unidos, responsáveis por tantos crimes e atentados terroristas nos cinco continentes. Basta citar apenas uma: o lançamento de duas bombas atômicas sobre as indefesas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki reduzindo instantaneamente a cinzas cerca de cento e dez mil pessoas e, segundo afirma o Boletim dos Cientistas Atômicos dos Estados Unidos , condenando muitos outros à morte nos anos seguintes, devido às consequências a longo prazo da radiação nuclear mortal.Por sua exemplaridade moral e sua incomparável solidariedade internacional, Cuba foi, junto com a Noruega, a fiadora das negociações de paz entre as FARC e o governo colombiano, e ainda hoje é fiadora das negociações entre Bogotá e a guerrilha do ELN. Retirar Cuba dessa lista infame, que agrava ainda mais o sofrimento que o bloqueio causa ao seu povo, é um ato de estrita justiça e integridade moral.

     É por isso que concluímos com Iroel que o presidente Biden, que constantemente pede a Deus que o ilumine nas difíceis decisões que tem que tomar diariamente, deveria hoje retirar Cuba de sua injusta inclusão em uma lista tão ignominiosa.


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Tradução/edição: Carmen Diniz/ Comitê Carioca de Solidariedade a Cuba                                 


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