#FIMDOBLOQUEIO
16/05/2016
Retirar os médicos formados no exterior prejudica mais de
45 milhões de brasileiros, justamente aquelas que mais precisam e que
moram nos municípios mais pobres.
Por Heider Pinto*, especial para o Saúde Popular
A imprensa tem noticiado que o atual Ministro da Saúde, do governo
interino que consideramos ilegal e ilegítimo (i³), tem anunciado que
reduzirá o número de médicos estrangeiros no Programa Mais Médicos (PMM)
e dará prioridade e aumentará os estímulos para a atuação dos
brasileiros. Reduzir arbitrariamente os estrangeiros é uma medida pouco
democrática e nada inteligente, como demonstraremos a seguir. Dar mais
estímulos aos brasileiros pode ser bom, e apontaremos algumas sugestões
neste texto.
1- A Lei do Programa já estabelece prioridade para os brasileiros
A Lei 12.871 de 2013 obriga que primeiro cada vaga deve ser oferecida
aos médicos com registro profissional no Brasil. Não ocupando todas as
vagas, as remanescentes são então oferecidas aos médicos brasileiros
formados no exterior e, só depois, restando ainda vagas é que as mesmas
são oferecidas aos médicos estrangeiros. Ou seja, a prioridade já está
dada em lei desde a criação do Programa.
2- Só tem muito estrangeiro no PMM porque os brasileiros não quiseram ir onde a população mais precisava
Como em 2013 os médicos brasileiros só se interessaram em ocupar 22%
das vagas oferecidas pelo PMM, as vagas necessárias para atender à
população mais vulnerável e dos municípios com maior necessidade só
foram ocupadas graças aos médicos brasileiros formados no exterior e
estrangeiros.
3- É crescente a adesão dos médicos brasileiros no PMM, mas ainda insuficiente
Com o aumento dos estímulos aos médicos brasileiros, como pontuação
adicional de 10% no concurso para a formação como especialista
(residência médica), além da bolsa e dos auxílios moradia e alimentação,
desde 2015 todas as novas vagas foram ocupadas por médicos brasileiros.
A maior adesão dos médicos brasileiros foi e deve seguir sendo
comemorada. Hoje, do total de 18,2 mil médicos, mais de 5,3 mil (29%)
são médicos com registro no Brasil. Contudo, aproximadamente 2/3 dos
municípios do PMM ainda não atrai os médicos brasileiros, fazendo com
que 45 milhões das 63 milhões de pessoas atendidas pelo Programa só
tenham atendimento devido à atuação dos médicos estrangeiros e
brasileiros formados no exterior.
4- O médico brasileiro fica menos tempo e abandona mais a atividade
Outro dado importante é que o tempo de atuação no Programa para todos
os médicos é de 3 anos, com exceção dos brasileiros que podem escolher
ficar 3 anos ou apenas 1 ano. Mesmo assim, 40% dos brasileiros abandonam
a atividade no Posto de Saúde antes de cumprir o prazo acordado. Este
número no caso dos estrangeiros é de 15%, e especificamente no caso dos
médicos cubanos, é de apenas 8%.
5- Os médicos estrangeiros são muito bem avaliados e estão nos locais com maior necessidade
Os médicos estrangeiros, como já foi dito, estão nos locais com maior
necessidade. Mas, além disso, as pesquisas de avaliação do PMM
conduzidas pelas Universidades têm mostrado uma excelente aprovação
desses médicos por parte da população e dos gestores municipais. Maior
capacidade de atendimento e de resolver problemas sem precisar
encaminhar, maior proximidade com a população e atendimento mais
humanizado tem sido a marca mais forte da atuação desses médicos. Isso
não se explica pelo fato de serem cidadãos cubanos, italianos, uruguaios
ou das mais de 40 nacionalidades presentes no Programa. A grande
questão é que são médicos que gostam de atuar na atenção básica e a
maioria são especialistas em medicina de família e comunidade. Enquanto
em diversos países há prioridade para essa especialização, no Brasil o
modelo voltado para o especialista do setor privado e do hospital
afasta, e não prepara os médicos nem para a atenção básica nem para o
SUS.
6- Das 2.700 vagas em Medicina de Família e Comunidade,
apenas 760 foram ocupadas por médicos brasileiros, as demais ficaram
ociosas
O PMM também oferece vagas para que os médicos se formem como
especialistas para a atuação na Atenção Básica. Mas do total de vagas
oferecidas, que só podem ser ocupadas por médicos brasileiros, só 28%
foram preenchidas. Hoje a residência, fundamental para mudar o perfil do
médico no Brasil e para melhorar em muito a qualidade do atendimento no
SUS, embora tenham melhorado a ocupação, ainda atrai pouco os médicos.
Com tudo isso fica claro que retirar os médicos formados no exterior
do PMM prejudica mais de 45 milhões de brasileiros, justamente aquelas
que mais precisam e que moram nos municípios que têm menos condições de
substituir esse médico por outro.
De fato, expulsar os médicos estrangeiros é um desejo das entidades
médicas mais conservadoras. Mas é pouquíssimo democrático deixar que a
xenofobia e preconceito de alguns milhares prejudique a vida de dezenas
de milhões. Além disso, é pouco inteligente fazer o contrário do que
diversos países do mundo têm feito: aumentar o estímulo para contar com
médicos estrangeiros em seus sistemas de saúde. Nos EUA mais de 1/4 dos
médicos são formados no exterior, e no Reino Unido quase 40%.
Também não é inteligente querer agradar a um grupo pequeno e
extremista e desagradar não só 45 milhões de pessoas atendidas e mais de
3 mil prefeitas e prefeitos beneficiados. Fazer isso depois da eleição,
pode parecer esperto, mas não é, e além disso, é desleal, oportunista e
demagógico.
Contudo, oferecer mais estímulo aos médicos brasileiros, sem prejuízo
dos estrangeiros, garantindo a sustentabilidade do Programa no médio
prazo é uma medida não só inteligente como necessária. Uma boa ideia
seria garantir à Bolsa de Residência em Medicina de Família e Comunidade
o mesmo valor da Bolsa do Mais Médicos quando aquela acontecesse nos
serviços de atenção básica em localidades que o SUS tem necessidade:
seria garantido apenas aos brasileiros tudo o que eles já tem no PMM e
agregar ainda mais um título de especialista, que é importante não só
para a qualidade do atendimento no SUS mas até para que esse médico
possa formar outros médicos nas novas escolas de medicina abertas também
pelo PMM.
*Médico, Mestre em Saúde Pública. Responsável pelo Programa Mais Médicos
Publicado por Saúde Popular
VENCEMOS !!! VENCEREMOS !!!
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