Arnaud Bertrand
É cada vez mais claro que
estamos assistindo a uma mudança radical na relação dos EUA com o mundo:
1) Os EUA desmantelam o
seu aparelho de interferência externa (como a USAID).
2) Marco Rubio afirma que
estamos agora num mundo multipolar com “multi-grandes potências em diferentes
partes do globo” e que “a ordem global do pós-guerra não é apenas obsoleta; é
agora uma arma que está sendo usada
contra nós”.
3) Tarifas sobre supostos
“aliados” como o México, o Canadá ou a UE.
Na realidade, os Estados
Unidos estão dizendo “a nossa tentativa de dominar o mundo acabou; cada um que
se vire ; somos agora apenas mais uma grande potência, não a ‘nação
indispensável’”.
Parece “idiota” (como o
WSJ acabou de escrever) se ainda se está mentalmente no velho paradigma, mas é
sempre um erro pensar que o que os EUA (ou qualquer país) fazem é idiotice.
A hegemonia estava
destinada a acabar, mais cedo ou mais tarde, e agora os EUA estão basicamente optando
por acabar com ela nos seus próprios termos. É a ordem mundial
pós-estadunidense, criada pelos próprios Estados Unidos.
Mesmo as tarifas sobre os
aliados, vistas deste ângulo, fazem sentido, uma vez que redefinem o conceito
de “aliados”: já não querem - ou talvez não se possam permitir - vassalos, mas
relações que evoluem de acordo com os interesses atuais.
Pode ser visto como um declínio (porque parece certamente o fim do império estadunidense) ou como uma forma de evitar um maior declínio: uma retirada controlada dos compromissos imperiais para concentrar os recursos nos interesses nacionais fundamentais em vez de ser forçado a uma retirada ainda mais complicada numa etapa posterior.
Em qualquer caso, é o fim
de uma era e, embora para muitos observadores a administração Trump pareça uma
confusão, é provável que esteja muito mais sintonizada com as realidades em
mudança do mundo e com a situação no seu próprio país do que os seus antecessores.
Reconhecer a existência de um mundo multipolar e optar por operar dentro dele
em vez de tentar manter uma hegemonia global cada vez mais dispendiosa não
poderia demorar muito mais tempo. Parece
caótico, mas é provavelmente melhor do que manter a ficção da primazia dos EUA
até que esta acabe por se desmoronar sob o seu próprio peso.
Isto não quer dizer que
os EUA não continuarão a causar estragos no mundo e, de fato, podemos estar
vendo-o tornar-se ainda mais agressivo do que antes, porque enquanto costumava
tentar (mal e muito hipocritamente) manter uma aparência de uma autoproclamada
"ordem baseada em regras", agora nem sequer tem que fingir estar
sujeito a quaisquer restrições, nem mesmo a de se dar bem com os seus aliados.
É o fim do império estadunidense, mas definitivamente não é o fim dos EUA como
uma força perturbadora importante nos assuntos mundiais.
No seu conjunto, esta
transformação pode marcar uma das mudanças mais significativas nas relações
internacionais desde a queda da União Soviética. E os menos preparados para
ela, como já é dolorosamente óbvio, são os vassalos da América, totalmente
chocados com a percepção de que o patrono em que confiaram durante décadas os
trata agora como apenas mais um grupo de países com quem negociar.
Interessante
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