8 de nov. de 2021

AFASTAR-SE DE TUDO QUE É DESUMANO - Por Silvio Rodriguez


por Silvio Rodríguez

     A estratégia de Obama para mim sempre foi clara: "não lute contra ele, aproxime-se de seu inimigo e o influencie". Podemos colocar os epítetos que quisermos, mas sem dúvida foi a política mais pacífica, a menos sangrenta de todos os presidentes norte-americanos que nos tocaram depois de 1959. Por outro lado, da mesma forma que recebemos bolsas e ficamos em lares de pessoas de nível médio nos Estados Unidos, pode fazer um jovem pensar  diferente que desde criança só conhece a nossa realidade –de vantagens sociais e carências materiais–, visitar Cuba, para um jovem norte-americano, pode significar uma grande mudança de mentalidade em relação ao que desde criança ouviu e leu sobre nós.

   É por isso que sempre disse que, na troca de influência de pessoa para pessoa, teríamos a vantagem. O porquê é simples. De nossa parte, sempre soubemos que materialmente se vive nos Estados Unidos muito melhor do que em Cuba. Nesse sentido, não há surpresas para o nosso cidadão que por ali passa, mas  quem teria surpresas, e muitas, seriam  os cidadãos norte-americanos, quando descobrissem a qualidade da solidariedade de nosso povo, apesar de suas deficiências. E eles não teriam que ler os editoriais que fervilham em nossa imprensa, escrita ou televisiva; bastaria viver um pouco entre nós para conhecer os efeitos do bloqueio a que seus dirigentes nos sujeitam há mais de seis décadas.

   A CIA, a USAID, o Soros e o bendito recipiente anglo-saxão sabem disso e vêm alertando todos os presidentes dos Estados Unidos: se abrirmos com Cuba, perderemos. Os primeiros a saber são os políticos de extrema direita na Flórida, herdeiros dos capangas de Batista. Por isso criaram o monstro da propaganda que reedita, geração após geração, uma feroz ideologia anticastrista filha do anticomunismo macartista. Esse monstro, alimentado por 6 décadas, já é um fator eleitoral que às vezes é decisivo, como está comprovado. Por tudo isso, a pressão sobre Cuba se intensifica. Ainda mais quando, apesar da nossa infeliz realidade econômica, sermos o único país do terceiro mundo que criou suas próprias vacinas contra a Covid19.

   Em relação à nossa realidade interna, sempre disse que não éramos o que iríamos ser, o que quer que fosse, mas o que o conglomerado de pressões externas e nossas próprias capacidades nos permitiu.

    Não adianta chorar ou lamentar. A realidade é a realidade. E se a queremos melhor, não podemos começar por ignorá-la ou tirar conclusões parciais. A justiça social, a exemplaridade moral e cívica também passam por compreender e assumir o que gera o complexo. Não esqueçamos o resultado das pressões e / ou repressões que ameaçam a impaciência - virtude ou defeito, dependendo de onde se olha. Os mais poderosos tentam nos sufocar há 62 anos. A melhor razão para se distanciar de tudo que é desumano.


(Comentário retirado de seu blog Segunda Cita) 


Tradução: Carmen Diniz


                         


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