Publicado dia 8 fevereiro, 2017 por siempreconcuba.
Em conformidade com uma história centenária de lutas pela independência plena, a identidade de Cuba e a nação em sim tem hoje uma de suas essências na emancipação, assumida como corrente de ação e pensamento.
No entanto, desde faz mais de um século um enclave militar estrangeiro vilipendiava esse fundamento nacional: a base naval mantida pelos Estados Unidos em Guantánamo - na região sudeste do país - na contramão da vontade do povo e do Governo da ilha.
Cuba considera ilegais essas instalações, além de uma violação à sua integridade territorial. A base norte-americana em Guantánamo tem uma extensão aproximada de 118 quilômetros quadrados, num lugar considerado desde sua ocupação como estratégico para o controle do mar caribenho.
Os Estados Unidos tomaram posse da zona em 1903, se valendo da imposição de condições à ilha para conceder-lhe a independência formal depois da retirada das autoridades coloniais espanholas.
Precisamente, foi ao amparo do Convênio para as Estações Carvoeiras e Navais, assinado entre os governos estadounidense e cubano, em circunstâncias em que o país caribenho não possuía praticamente independência alguma devido a um adendo endossado à sua Constituição, conhecido como Emenda Platt.
Esse último documento, uma vergonha para a nação cubana, foi aprovado pelo Congresso norte-americano e assinado pelo presidente William McKinley em março de 1901. Ademais, a ilha encontrava-se ocupada militarmente pelos vizinhos do Norte, depois da intervenção destes na guerra de independência de Cuba contra a metrópole espanhola.
Apesar da rejeição interna gerada, a Emenda Platt foi incorporada como adendo à Constituição da República de Cuba depois de sua aprovação no dia 12 de junho de 1901, em uma sessão da Assembleia Constituinte, com 16 delegados a favor e 11 contrários. A adoção do texto era uma condição para a retirada das tropas estadounidenses.
Em seu artigo, a emenda assinalava que Cuba arrendaria aos Estados Unidos extensões de terra e água para estabelecer estações carvoeiras ou navais pelo tempo que fosse necessário. Definia que os EUA exerceriam jurisdição e dominação completas sobre essas zonas.
Finalmente, em virtude do referido adendo, em fevereiro de 1903 foi subscrito em Havana e Washington o Convênio para as Estações Carvoeiras e Navais, o qual incluía duas áreas: Guantánamo e Baía Funda, ainda que na última nunca foi estabelecida uma base naval.
Três décadas depois, como resultado das lutas do povo da ilha que puseram fim ao governo pró-norte-americano de Gerardo Machado, foi assinado um novo Tratado de Relações entre a República de Cuba e os Estados Unidos que anulou a Emenda Platt. O novo acordo excluiu definitivamente a Baía Funda como possível local para a instalação de uma base, mas manteve a de Guantánamo, bem como as normas que a regiam.
Mais tarde, em 1940, uma nova Constituição promulgada na maior das Antilhas estabeleceu que não marcar-se-iam nem ratificariam pactos que limitassem a soberania nacional ou a integridade do território.
Não obstante, a oligarquia cubana pôs todo sua empenho em que os postulados mais avançados daquela Lei não se materializassem ou, ao menos, que sua aplicação fosse restringida ao máximo.
AGRESSÕES, ABSURDOS E VERGONHA PLANETÁRIA
Desde 1959, o Governo da ilha denunciou em repetidas oportunidades e em diversos palcos internacionais a ocupação ilegal por parte de Estados Unidos de uma porção de território em Guantánamo.
Segundo as autoridades da nação caribenha, a partir de janeiro do mencionado ano, os EUA converteram a base naval num foco de constantes ameaças, provocações e violações da soberania de Cuba com o objetivo de pôr obstáculos ao processo revolucionário.
Ademais, afirmam que em quase seis décadas a relação de agressões inclui o lançamento de materiais inflamáveis desde aviões procedentes do enclave, provocações, insultos e disparos feitos pelos soldados norte-americanos, violações das águas e do território de Cuba por embarcações e aeronaves militares, bem como torturas e assassinatos de pessoas residentes nesta zona.
Dados proporcionados por Cuba indicam que entre 1962 e 1996 se produziram 8 mil 288 violações principais a partir da base de Guantánamo; dessas, 6 mil 345 aéreas, 1.333 navais e 610 territoriais. Do total referido, sete mil 755 incidentes registaram-se entre 1962 e 1971.
Desde 1959 até a data presente, só numa oportunidade a ilha converteu em rendimento nacional (compensou) o cheque estadounidense por conceito do aluguel do território ocupado pela base. Sucedeu no primeiro ano da Revolução no poder e deveu-se a uma confusão, segundo a parte cubana. A partir de 1960 os cheques não se cobraram mais e ficaram como constantes de uma imposição.
Até 1972 o ‘pagamento’ anual era de 3.386,25 dólares, quando os norte-americanos o reajustaram por sua conta a 3.676. Um ano mais tarde fez-se uma nova correção do valor, calculado pelo Departamento do Tesouro, elevando-o a 4.085 dólares anuais, pouco mais ou pouco menos do que o aluguel mensal atual de um apartamento de dois dormitórios em Manhattan, Nova York.
Esses cheques destinam-se à Marinha de Estados Unidos e dirigem-se à Tesouraria Geral da República de Cuba, servidor público que não faz parte da estrutura governamental da ilha há anos.
Por outro lado, no território cubano ocupado pela nação estadunidense também existe uma prisão denunciada internacionalmente como um centro de torturas e por cujo fechamento se pronunciaram personalidades e organismos de todo mundo, incluídos numerosos estadounidenses e a ONU.
Em 2002, uma porção da base de Guantánamo foi usada para albergar prisioneiros capturados em Afeganistão suspeitos de ter vínculos com a Al Qaeda. Precisamente, o status legal da zona ocupada foi um dos motivos da eleição do lugar para a detenção de tais indivíduos.
Como as referidas instalações estadounidenses se encontram em Cuba, o Governo dos EUA alegou que os detentos dali se encontram legalmente fora de Estados Unidos e, portanto, não tem os direitos constitucionais que teriam, caso lá estivessem presos.
Do mesmo modo, comprovou-se que muitos dos prisioneiros foram transladados a Guantánamo em voos secretos da Agência Central de Inteligência (CIA) norte-americana com a cumplicidade de governos europeus.
Relatórios de várias instituições internacionais assinalam que ali se comentem práticas como a exposição dos detentos a ruídos ou música molesta, a temperaturas extremas por períodos prolongados, surras e humilhações de diversa índole.
Segundo políticos norte-americanos do nível de George W. Bush, a informação obtida mediante interrogatórios com métodos violentos no cárcere ajuda a evitar atentados terroristas.
Assim justificou a tortura o mencionado ex-presidente numa ocasião em 2010, quando, ademais, afirmou que tal prática permitia salvar vidas. “O método é duro, mas a CIA assegurou que não produzia danos permanentes”, disse.
Apesar de a anterior administração estadounidense, encabeçada por Barack Obama, se referir em algumas oportunidades ao fechamento da prisão de Guantánamo, essas instalações continuam ali, para vergonha planetária.
Apesar de as autoridades norte-americanas manifestarem-se sobre o fechamento do centro, nunca mencionam a devolução do território ocupado, a qual é uma das exigências de Cuba para a normalização das relações bilaterais, um processo que começou em dezembro de 2014.
De acordo com Michael Strauss, autor do livro ‘The Leasing of Guantanamo Bay’ (2009), depois de um suposto fechamento da prisão, Guantánamo não teria quase nenhum valor para Estados Unidos.
Numa entrevista concedida a BBC Mundo e publicada em março de 2016, o professor e pesquisador recordou que, com os avanços tecnológicos, alocar naves na baía já não faz sentido e, portanto, não se justifica a presença da Marinha.
Outro especialista, o acadêmico da Universidade de Harvard Jonathan Hansen, declarou à Imprensa Latina em 2013 que a prisão é, entre outros, um pretexto para manter a presença militar de Estados Unidos em Cuba.
Ademais, o Governo norte-americano cita a extraterritorialidade do enclave para manter ali um centro de sua alegada guerra contra o terrorismo no qual realiza atos proibidos pelas leis estadounidenses, com a desculpa agregada de preservar a segurança nacional, disse.
Enquanto isso, nos grandes meios de comunicação de Estados Unidos prevalece o silêncio sobre a ocupação de uma parte do território cubano, acrescentou Hansen.
Por sua vez, o presidente do Instituto de História de Cuba, René González, considerou que o enclave norte-americano no sudeste da ilha é um absurdo estratégico, militar e político.
Em poucas palavras: a base naval de Estados Unidos em Guantánamo é um pretexto para manter as tensões, um lugar suscetível a ser utilizado para agressões de diferentes tipos, um insulto à nação e uma espinha que desde faz 114 anos dilacera a soberania cubana.
(Luis Antonio Gómez/Prensa Latina)
(Luis Antonio Gómez/Prensa Latina)
Publicado originalmente em: https://siempreconcuba.wordpress.com/2017/02/08/historia-guantanamo-la-espina-que-lacera-la-soberania-cubana/
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