29 de ago. de 2025

DE WASHINGTON E JEFFERSON A TRUMP E RUBIO. AMEAÇAS PARA ELEGER UM PEÃO.

De Washington e Jefferson a Trump e Rubio: Ameaças para eleger um peão 

Hernando Calvo Ospina


   Com exceção de John Adams e seu filho, John Quincy, os primeiros 12 presidentes dos EUA, alguns deles chamados de "Pais Fundadores", não apenas possuíam centenas de escravos, mas também implementaram medidas para desapropriar os nativos americanos de suas terras e aprisioná-los em campos de concentração chamados reservas. George Washington, o principal Pai Fundador, que a história preservou imaculadamente, estava acompanhado por alguns de seus escravos quando tomou posse como o primeiro presidente na sacada do Federal Hall, em Wall Street, na cidade de Nova York, em 30 de abril de 1789. É muito importante lembrar que esta rua de oito quarteirões havia sido inaugurada em 13 de dezembro de 1711, como a primeira bolsa de valores dos Estados Unidos, mas para o leilão de escravos.

    E embora seja difícil de acreditar, na mesma rua, a poucos passos de onde negros e alguns indígenas rebeldes negociavam, Washington também aprovou a Declaração de Direitos, com as dez primeiras emendas à Constituição, em 15 de dezembro de 1791, que se tornou um símbolo de liberdade e igualdade naquela nação, embora os indígenas não fossem considerados cidadãos, e as mulheres tivessem seus direitos severamente restringidos até 1920.

     Thomas Jefferson, outro Pai Fundador, redator da Declaração de Independência, um dos estadistas mais pró-escravidão e um fervoroso promotor das reservas indígenas americanas, foi nomeado por Washington como o primeiro Secretário de Estado do país, de 1790 a 1793. Ele já havia servido como diplomata na França, de 1785 a 1789.

  Bem, esses dois supremacistas brancos, donos de escravos, racistas e desprezadores de mulheres foram os arquitetos da diplomacia americana.

  É "normal", então, o desprezo que presidentes e seus secretários de Estado têm demonstrado desde então pela grande maioria dos povos do mundo, onde os seres humanos são meras mercadorias ou obstáculos a serem eliminados para o desenvolvimento de sua voracidade imperial.

  Desde então, Secretários de Estado têm viajado pelo mundo relatando crimes, massacres e genocídios, cometidos e não cometidos, enquanto pressionam por apoio. A arrogância que acompanha o poder levou muitos a serem vis e arrogantes na defesa do indefensável. Outros conseguiram explicar esses rios de sangue: eles invadem e matam em nome das vítimas e por "valores democráticos". E deixam boa parte da humanidade convencida das boas intenções de sua nação.

  Deste último grupo, especialistas em política internacional mencionam os contemporâneos: John Foster Dulles, no governo Eisenhower (1953-1959); Madeleine Albright, a primeira mulher Secretária de Estado (1997-2001), no governo Clinton; Colin Powell, o primeiro Secretário de Estado afro-americano (2001-2005), no governo Bush; Hillary Clinton (2009-2013), no governo Obama; Antony Blinken (2021-2025), no governo Biden. Há um que merece menção especial: Henry Kissinger, Secretário de Estado dos governos Nixon e Ford (1973-1977). Apesar de ter participado como mentor de tantos crimes contra a humanidade, foi agraciado com o Prêmio Nobel da Paz. Ele é talvez o Secretário de Estado mais inteligente, manipulador e maquiavélico que o país já teve.

   Há também os piores Secretários de Estado da história dos Estados Unidos. Eles ganharam esse "reconhecimento" público por não possuírem as qualidades essenciais para o cargo: liderança experiente em política externa, habilidades de negociação, conhecimento de organizações internacionais e visão estratégica para aconselhar o presidente e representar o país no exterior. Entre eles, está Warren Christopher (1993-1997), no governo Clinton. Considerado um burocrata pouco carismático e péssimo em resolver crises internacionais. Rex Tillerson (2017-2018), apesar de ter sido presidente da petrolífera ExxonMobil, era um péssimo diplomata e nem sabia como lidar com a gestão interna do Departamento. Alguns o consideravam um completo "idiota". Mike Pompeo (2018-2021), no governo Trump. Embora tenha chefiado a CIA anteriormente, as avaliações dos especialistas são, em sua maioria, negativas. O New York Times o nomeou o pior dos piores da história dos Estados Unidos.

     É impressionante que ambos os Secretários de Estado do primeiro governo Trump estejam nessa lista dos piores. Houve um "interino", John Sullivan, que durou 25 dias, mas ninguém se lembra dele.

 Uma das organizações internacionais que o Secretário de Estado deve supervisionar é a Organização dos Estados Americanos (OEA). Sua sede fica em Washington, por decisão dos Estados Unidos. Fundada em Bogotá em 30 de abril de 1948, quando a Colômbia começava a mergulhar no que viria a ser conhecido como a "era da violência", que perdura até hoje, foi criada no contexto do pós-guerra e do início da Guerra Fria. Para os Estados Unidos, era imperativo ter os países do continente sob seu controle, antecipando que a União Soviética e seu "comunismo" chegariam para romper seu poder. A Carta da Organização foi assinada na capital colombiana. Foi redigida em Washington, mas apresentada pela delegação colombiana, tornando-se a base ideológica da Guerra Fria. Seu primeiro Secretário-Geral foi Alberto Lleras Camargo, um colombiano que gozava de absoluta confiança nos Estados Unidos e que ocupou o cargo até 1954, moldando a OEA de acordo com os interesses de seu chefe.

  Talvez o ato mais simbólico que demonstrasse o propósito da OEA tenha ocorrido em 31 de janeiro de 1962, durante uma conferência ministerial em Punta del Este, Uruguai: Cuba foi expulsa. Argumentou-se que a ilha revolucionária havia se alinhado à União Soviética e ao comunismo, o que era "incompatível" com o sistema interamericano. Posteriormente, o Comandante Fidel Castro usou uma frase que a expôs: era o "Ministério das Colônias" dos EUA.

  A OEA serviu como um meio para Washington cumprir suas ordens. Foi útil para legalizar ações que violam a soberania de seus outros membros. Nunca serviu para impedir tantos golpes de Estado orquestrados por Washington contra governos democraticamente eleitos. E quando alguns governos rejeitaram as decisões de Washington, raramente receberam qualquer atenção. Um de seus objetivos foi defender o continente de agressões externas, mas quando a Argentina buscou recuperar as Malvinas e a Inglaterra enviou suas tropas, os Estados Unidos, a Colômbia e a ditadura de Pinochet lhe deram as costas.

  Seu secretário-geral deve ser eleito por voto, mas deve ter a bênção de Washington. O penúltimo deles, Luis Almagro, uruguaio, é considerado o pior do grupo: não só semeou divisão e discórdia entre seus membros, como também foi o mais simpático aos interesses dos EUA. Ele já havia servido como Ministro das Relações Exteriores do presidente José Mujica, quando este foi eleito em 2015 e reeleito em 2020. Ebrard Casaubón, que foi Ministro das Relações Exteriores do México, disse sobre o governo de Almagro: "É um dos piores da história (...) Ele tomou medidas muito duvidosas, como o caso da Bolívia, que praticamente facilitou um golpe" contra Evo Morales.

  Governos que não seguiram a agenda de Washington tornaram-se inimigos de Almagro, com Venezuela e Nicarágua sendo suas principais frentes de guerra. E permaneceram assim mesmo após a saída de ambas as nações da Organização. O mesmo aconteceu com Cuba, 63 anos após sua expulsão. Quando a grave crise econômica e humanitária na Venezuela eclodiu, principalmente entre 2015 e 2021, devido ao bloqueio econômico imposto pelos EUA e seus aliados europeus, Almagro defendeu abertamente uma invasão ao país bolivariano para impor um governo "não hostil" a Washington.

  E para suas campanhas contra os governos revolucionários e progressistas, Almagro contou com pessoas que ecoavam sua mensagem, que, como sabemos, eram a voz do Departamento de Estado. Uma delas, parte da "escola Almagro", era Rosa María Payá, de origem cubana.

  Ela é filha do "dissidente" Oswaldo Payá, que morreu quando o veículo em que viajava bateu em uma árvore em 22 de julho de 2012. Apesar de o cidadão espanhol que o acompanhava alegar que o motivo era o excesso de velocidade, Rosa María começou a repetir em todos os lugares que o governo cubano havia causado o acidente. Nunca a incomodou que o Tribunal Nacional Espanhol também tivesse se pronunciado sobre o acidente.

  Logo aprendeu que, para apaziguar o público, precisava sempre começar mencionando a morte do pai, com voz e rosto arrependidos. Repetiu também, quase angustiada, que era perseguida pela "ditadura castrista", razão pela qual não podia retornar a Cuba. Escondeu as inúmeras vezes em que viajou à ilha sem ser incomodada, mesmo tendo residência legal. Ao incitar a compaixão, tornou-se parte importante das campanhas de difamação dos EUA.

  Assim, sob a sombra de Almagro e outros políticos de extrema direita do sul da Flórida, como o senador Marco Rubio, ele também dirigiu suas críticas a governos progressistas como os de Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil, Andrés Manuel López Obrador, no México, e Gustavo Petro, na Colômbia. Ele chegou a criticar o chileno Gabriel Boric, que pouco se envolveu com o progresso.

  Claro, ela tem sido constante e sistemática em atacar os governos de Cuba, Venezuela e Nicarágua: se você a ouvir, não há necessidade de consultar o que o Departamento de Estado diz sobre eles.

  Trabalhando em projetos necessários para Washington, Almagro e Payá tornaram-se amigos próximos, com alguns até afirmando que seu relacionamento ia além de interesses políticos e ideológicos. O ex-chefe da OEA a ajudou a obter financiamento de até dois milhões de dólares por ano, ao mesmo tempo em que abriu portas para instituições globais. Com os dólares fornecidos pela USAID, NED, OEA e outras organizações alinhadas a Washington para seu suposto trabalho em direitos humanos, Rosa María Payá acumulou um capital pessoal significativo, incluindo propriedades luxuosas nos Estados Unidos.

  Em 30 de maio, o surinamês Albert Ramdin tomou posse como novo Secretário-Geral da OEA. Justamente quando se pensava que a Organização assumiria uma nova dinâmica, em 27 de junho, Rosa María Payá foi eleita membro da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) durante a 55ª Assembleia Geral da OEA, realizada em Antígua e Barbuda, para o mandato de 2026-2029. México, Brasil, Colômbia e Chile estavam entre os que se opuseram à sua nomeação, mas onde o capitão manda, não manda o marinheiro, diz-se: ela era a candidata dos Estados Unidos, apresentada oficialmente dias antes pelo Secretário de Estado Marco Rubio, também de origem cubana.

  "Os Estados Unidos", disse Rubio em um comunicado, "instam outros Estados-membros da OEA a apoiar a candidatura de Rosa María Payá e a ajudar a garantir que a CIDH continue sendo uma defensora forte, íntegra e confiável dos direitos humanos para todos". No comunicado, ele descreveu Payá como "uma defensora íntegra, corajosa e profundamente comprometida com os direitos humanos e a democracia", capaz de servir a região "com independência, integridade e um firme compromisso com a justiça".

  Sem a assinatura de Rubio, o Departamento de Estado acrescentou que Payá é "uma defensora da democracia de renome internacional, líder dos direitos humanos e especialista em políticas latino-americanas... reconhecida por seu trabalho na promoção da liberdade, dos direitos humanos e da governança democrática em todo o Hemisfério Ocidental".

  Para responder a tal elogio, basta entender a "trajetória" de Payá e compará-la com a resolução emitida pela Assembleia Geral da OEA em Lima 2022. Ela estabeleceu parâmetros que os Estados-membros deveriam seguir em seus processos de nomeação e avaliação de candidatos aos órgãos da OEA: sempre observando "o cumprimento dos requisitos de independência, imparcialidade, alta autoridade moral e reconhecida competência em matéria de direitos humanos", além de possuir conhecimento e experiência em questões relacionadas ao sistema interamericano de direitos humanos.

 No caso da Sra. Payá, ela deve começar a se educar imediatamente para não fazer papel de boba; para que não fique muito óbvio que ela foi imposta, não eleita pela vontade dos membros.

   Ela é formada em Física pela Universidade de Havana e recebeu treinamento em programas de "liderança" na Universidade de Georgetown. Esses "programas" são bolsas de estudo que o regime americano oferece a jovens de países com governos considerados contrários aos seus interesses.

   Rosa María Payá é a fundadora e quase única membro do Cuba Decide, que, segundo o Departamento de Estado, lidera "o movimento pró-democracia mais proeminente" na ilha. Apoiada por Almagro e pela extrema direita da Flórida, ela foi nomeada diretora executiva da sombria Fundação para a Democracia Pan-Americana, para promover "segurança regional, direitos humanos e estabilidade democrática".

    Em Washington, sabe-se que um prêmio poderia ser concedido a qualquer pessoa em Cuba que soubesse das atividades de Payá, já que se trata de pessoas e dispositivos usados ​​para realizar trabalhos internacionais contra a imagem da revolução e de quaisquer governos necessários.

    Ao saber da nomeação, Payá expressou sua "profunda honra" e agradeceu ao Secretário de Estado pelo apoio. Nas redes sociais, prometeu "servir a todos os povos das Américas". "Minhas prioridades são claras: proteger aqueles que mais precisam, defender a democracia, garantir uma comissão eficaz e transparente e aproximar o sistema dos mais vulneráveis."

   Ah, mas não se conteve e atacou os governos de Cuba, Nicarágua e Venezuela, que o Secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, considera "inimigos da humanidade". Payá declarou: "As Américas pagaram um preço muito alto por tolerar o regime cubano por tanto tempo". "Cabe a nós, mulheres e homens das Américas, acabar de uma vez por todas com a cabeça do polvo autoritário e todos os seus tentáculos, que causaram tanta dor às nossas nações."

  Mas Marco Rubio teve que insistir na manhã de sexta-feira, antes das eleições, pois ainda duvidava que seu candidato fosse escolhido: "Rosa María traz a dignidade e a determinação necessárias para enfrentar os maiores desafios da Comissão com soluções inovadoras".

 Por isso, na quinta-feira, durante a Assembleia, o subsecretário de Estado Christopher Landau teve que se manifestar em alto e bom som, exigindo, por meio de ameaças e chantagem, a eleição de Payá. O ponto-chave foi alertar sobre o desgaste do governo Trump com a OEA, que não conseguiu derrubar o governo bolivariano da Venezuela. Isso lançou dúvidas sobre a futura adesão dos Estados Unidos.

    Se tivessem alguma dignidade, teriam aplaudido essa possibilidade, porque, além disso, já existe uma organização da qual nem os Estados Unidos nem o Canadá fazem parte: a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), criada em 2010, que reúne 33 nações e mais de 600 milhões de habitantes.

   Landau disse: "Como vocês devem saber, o presidente (Donald) Trump emitiu uma ordem executiva no início deste governo instruindo o secretário de Estado (Marco Rubio) a revisar todas as organizações internacionais das quais os Estados Unidos são membros para determinar se tal filiação é do melhor interesse dos Estados Unidos e se essas organizações podem ser reformadas (...) e, obviamente, a OEA é uma das organizações que estamos revisando."

    E concluiu lembrando que os Estados Unidos apoiaram a nomeação de Payá e não poderiam ficar de fora quando o governo Trump considera que a OEA não está fazendo nada de substancial contra as ditaduras na América Latina, que são, como sabemos, Cuba, Venezuela e Nicarágua...

 Veremos o que acontece com o novo Secretário-Geral, Albert Ramdin, que, como Ministro das Relações Exteriores do Suriname, se recusou a caracterizar o governo do presidente Nicolás Maduro como uma ditadura. Rubio já o questionou. 

    Secretários de Estado sempre usaram chantagem e ameaças para atingir seus objetivos, mas ter que fazer isso como Marco Rubio fez para eleger seu indicado demonstrou o quão pouco respeito e confiança ele inspira na América Latina e no Caribe. Sem mencionar o quão pouco ele significa para o resto do mundo. Trump estava certo quando o chamou de "Pequeno Marco"( markito)  Talvez, em um futuro próximo, ele seja considerado o quarto pior Secretário de Estado da história diplomática daquele regime. E o terceiro pior do regime Trump. Isso seria um recorde mundial !

 

https://venezuela-news.com/de-washington-y-jefferson-a-trump-y-rubio-amenazas-para-hacer-elegir-a-una-ficha-por-hernando-calvo-ospina    (2/7/2025) 

Trad/ed: Comitê Carioca de Solidariedade a Cuba e às Causas Justas.

                     



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