31 de jan. de 2021

16 LIÇÕES PARA A NOVA AMÉRICA

 Li María Pichs Hernández*

            Mais de um século já passou, desde que Nossa América, esse texto irrepetível, veio à luz, primeiro em La Revista Ilustrada de Nova York, em 1º de janeiro de 1891, e depois em El Partido Liberal do México, em 30 de janeiro de 1891.

            Naquele momento, fazia poucos meses que tinha terminado a primeira Conferência Internacional Americana (outubro 1889 – abril 1890) e recém começavam as reuniões da Comissão Monetária Internacional (janeiro-abril 1891) em Washington. Foram esses convites pan-americanos que demonstraram a Martí, sem sombra de dúvida, a sede expansionista do pujante imperialismo estadunidense.

            Fazia uns setenta anos que o presidente James Monroe declarara aquela que conhecemos como Doutrina Monroe, em 1823. Fazia uns 50 anos, desde que os Estados Unidos tinham adotado a doutrina do Destino Manifesto e que, depois dela, tinham invadido o México (1846), para só sair com a assinatura do Tratado de Guadalupe Hidalgo, com o qual o México vendeu grande parte de seu território ao norte. Tinha passado apenas um ano da publicação daquele livro de Alfred Mahan, “A influência do poder marítimo na história (1660-1780)”, em que ainda se podem encontrar os objetivos hegemônicos com os quais os Estados Unidos entraram na guerra de Cuba com a Espanha, desencadeando a guerra hispano-cubano-norte-americana em 1898, da qual emergiu com o controle do mar do Caribe, com Cuba e Porto Rico, e do sudoeste do oceano Pacífico, com a ilha de Guam e as Filipinas, todas arrebatadas da decadente Espanha.

            Mais de um século passou, desde que Nossa América, esse texto irrepetível, veio à luz. Quem diria que Guam continuaria sendo um dos “territórios autônomos” sob a bandeira das muitas estrelas e muitas listras. Quem diria que o México e mais toda a América Central continuariam sofrendo as terríveis consequências dessa relação tão desigual com o vizinho do Norte. O que dizer dos obstáculos enfrentados por aqueles que disseram “Basta!”, lá no Cone Sul, e ousaram traçar rumos diferentes em relação a esses do vizinho exaltado e brutal, que ainda nos despreza. O que dizer do Caribe, onde a bandeira estadunidense ainda tremula mais alto que a nacional na terra porto-riquenha, e de onde projeta ainda sua sombra colorida sobre a terra cubana, aí na boca da baía de Guantânamo, onde o vizinho tenta seguir invocando o Tratado Permanente, aquele que quis tornar imortal a Emenda Platt, hoje com quase 120 anos.

            Dói que, quanto mais clara a expressão, mais difícil nos seja colocá-la em prática. Quanto mais claro Martí teria de ser, com as palavras que deixou, contundentes e diretas, no ensaio Nossa América?

            Quanto mais vamos reler e reanalisar a semiótica, a hermenêutica e tantas outras ribombâncias nesse discurso?

            Quanto mais vamos invocar o gênio inigualável de Martí, suas capacidades sobre-humanas, sua mística inenarrável e páginas e páginas de seu curriculum vitae?

            Quantas páginas e páginas mais vamos dedicar a anatomizar os mil perigos que Martí foi capaz de condensar nas 5 laudas de Nossa América?

            Quanto tempo mais vamos esperar, até que saiam à luz, com o mesmo ou maior empenho, as soluções que também estão aí no ensaio, ainda mais contundentes e concretas que os problemas descritos?

            O que falta fazer, senão arrancar das páginas mortas as soluções que Martí propõe a cada problema?

            O que falta fazer com essas palavras nosso-americanas, claras e pungentes, senão convertê-las em um programa de luta continental?

            Propomos a seguir o que consideramos as linhas fundamentais desse programa nosso-americano. De cada ideia, daria para compor um capítulo completo. Mas essa não é uma tarefa para uma só pessoa… e sim de povos inteiros. Estes princípios, embora latentes em tantos projetos, em todo o nosso continente, no exato instante em que se leem estas linhas, não são mais que pulsações dispersas e discordes, que quase não se reconhecem entre si. Daí a necessidade de colocar, em um único documento, os passos que, segundo Martí, são necessários para que, mais além das características particulares de um e outro arranque revolucionário, todos pulsem em sintonia. Só assim finalmente entenderemos que, depois de tudo e antes de mais nada, vivemos, lutamos e morremos com o mesmo coração.

  1. “O que reste de aldeia na América tem de despertar”.
  2. “[…] as armas da razão, que vencem as outras”.
  3. “Os povos que não se conhecem têm de se apressar para conhecer-se, como quem luta junto”.
  4. “As árvores têm de enfileirar-se[...]”.
  5. “É preciso carregar os navios com esses insetos daninhos, que roem o osso da pátria que os alimenta”.
  6. “O governo tem de nascer do país”.
  7. “Não há batalha entre a civilização e a barbárie, mas entre a falsa erudição e a natureza”.
  8. “A universidade europeia tem de ceder à universidade americana”.
  9. “É preciso estabelecer uma causa comum com os oprimidos, para garantir o sistema oposto aos interesses e hábitos de mando dos opressores”.

10. “[…] a virtude superior, alimentada com o sangue necessário, da república que luta contra a colônia”.

11. “[…] ajustar a liberdade ao corpo dos que se levantaram e venceram por ela”.

12. “[…] o pensamento começa a ser da América”.

13. “Os povos têm de viver criticando-se, porque a crítica é a saúde; mas com um único peito e uma única mente”.

14. “[…] o dever urgente de nossa América é mostrar-se como é [...]”

15. “Os povos devem ter um pelourinho para que lhes insufla ódios inúteis; e outro para quem nos lhes diz em tempo a verdade”.

16. “[…] o estudo oportuno e a união tácita e urgente da alma continental”.

            Somente pondo em prática essas máximas poderemos afirmar, neste momento, o que para Martí, 130 anos atrás, era a mais completa e formosa visão do futuro continental:

            “Porque já soa o hino unânime; a geração atual carrega, pelos caminhos abertos pelos pais sublimes, a América trabalhadora; do Bravo a Magalhães, sentado nas costas do condor, espalhou o Grande Criador, pelas nações românticas do continente e pelas ilhas dolorosas do mar, a semente da América nova!”




*membro do Movimento Juvenil Martiano,, especialista do Gabinete do Programa Martiano 


Tradução: Comitê Carioca de Solidariedade a Cuba 

https://red26.home.blog/2021/01/31/16-lecciones-para-la-america-nueva/





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