Carmen Diniz #
Neste domingo dia 25 de setembro os cubanos
vão às urnas para votar em referendo o novo Código das Famílias cubano que vai
substituir, atualizar e revolucionar a norma anterior de 1975. É o primeiro
Código de Família submetido a referendo popular no mundo e seus avanços são
incontestáveis, sendo o estatuto que protegerá as famílias cubanas para os
próximos 40 – 50 anos.
O processo se iniciou com uma Consulta
Especializada entre setembro e outubro de 2021 e após, em 12 de janeiro de 2022
com a publicação em Diário Oficial pela Assembleia Nacional do Poder Popular
(órgão máximo de Cuba) do Projeto de Lei do Código das Famílias com a
finalidade de submetê-lo à Consulta Popular entre 1° de fevereiro a 30 de abril
de 2022. Contando com a aprovação de cerca de 62% dos participantes. De se
ressaltar que o Projeto e a consulta atendem à
11° Disposição Transitória da
Constituição de 2019 que trata da família em seus artigos 81 a 89. Participaram da Consulta 47 instituições e
grupos sociais cubanos como assembleias de bairros, centros de trabalho,
universidades, centros estudantis.
O Código revoluciona o conceito de família
com especial ênfase no matrimônio incorporando reformas e ampliações de
direitos para que se permita, por exemplo, o matrimônio igualitário dois anos
após a reforma constitucional em 2019.
Uma nova concepção de família, ampliada na qual os laços afetivos
importam mais que os consanguíneos e os direitos LGBT para crianças e
adolescentes sejam respeitados.
A oposição da igreja católica ao Código tem
mínima influência em Cuba pelo fato de existir um grande ecumenismo no país e o
estatuto recusa o pensamento conservador e se posiciona contra a exclusão de
direitos por discriminação, de acordo com os princípios constitucionais. A
ideologia patriarcal estabelece desequilíbrios nas relações de poder e o Código
se posiciona em dar voz a pessoas e realidades que eram silenciadas dentro da
própria família. Assim é que na Consulta
Especializada os psicólogos alertaram para que as famílias não sejam espaços de
opressão e sim espaços de desenvolvimento e bem estar para que “ O amor seja
lei” *.
É com esses princípios que o Código das
Famílias vai a referendo popular neste domingo 25 de setembro de 2022. Trata-se
de um código absolutamente inclusivo que com 11 títulos e 474 artigos amplia o
conceito das famílias qualquer que seja sua estrutura ou organização para
formar uma família para que se preserve: respeito mútuo, lealdade,
solidariedade e o AFETO com a finalidade
de fazer felizes os que a compõem.
Algumas inovações são especialmente incluídas:
Mudança
da denominação do Pátrio Poder**para Responsabilidade Parental .
Importante ressaltar que, ao contrário das falsas informações divulgadas, os
pais não perdem o controle sobre seus filhos (ver a respeito texto sobre a
inominável Operação Peter Pan que tem sido divulgado para criar obstáculo ao
referendo : https://bit.ly/3dsoZMl ) .
Aqui o que o código propõe é que crianças e adolescentes sejam considerados
sujeitos de direitos e não propriedade dos pais. Dessa forma, não se retiram os
direitos dos pais ou responsáveis, mas amplia as responsabilidades destes com o
seu bem estar: as crianças e adolescentes como sujeitos de direito por eles mesmos
ou através de seus pais e/ou tutores de acordo com a Convenção dos Direitos da
Criança a que Cuba aderiu.
A relação entre pais e filhos muda de um sistema
de poder à responsabilidade, o direito-dever de ter os filhos consigo, cuidar,
dar amor, estabilidade emocional, educar sem violência e respeitar suas
características, com uma comunicação efetiva e afetiva para que se escute a
criança/adolescente (menor de 18 anos) em autonomia progressiva. Como exemplo,
a questão de identidade de gênero somente aos 18 anos, com a maioridade.
Além disso, o novo Estatuto prevê a possibilidade de qualquer pessoa poder
denunciar tratamento de discriminação e violência no espaço familiar para
efeitos jurídicos, de não permitir matrimônio, mesmo com autorização judicial
ou dos pais, a menores de 18 anos (antes se podia meninas com 14 e meninos com
16)
O
Código das Famílias prevê a proteção à vida familiar sem desigualdade,
suprimindo a prioridade da heterossexualidade e assim, o direito de TODAS as
pessoas de contrair matrimônio e fundar uma família sem discriminação por
qualquer condição ou circunstância pessoal.Assim sendo,matrimônio, união de
fato afetiva, adoção ou reprodução assistida “Toda forma de amor vale a pena”
como diria a música. Da mesma forma o divórcio passa a funcionar sem se
ventilar culpa e bastando a vontade de uma só das partes do casal.
Se fortalece o parentesco por afinidade ou
seja, além da consaguinidade e da adoção se soma a reprodução assistida e a que
se origina na socio-afetividade, sem depender unicamente do matrimônio, se
somando o regime jurídico de mães/pais/avós/filhos afins (madrastas e
padrastos), reforçado o direito/dever de comunicação a todo o grupo familiar.
Surge a figura de pais e mães afins, os cônjuges ou casais afetivos que
convivem ou têm a guarda com famílias reconstituídas. Ou seja, se pode ter
legalmente mais de um pai ou de uma mãe por causas originárias ou
supervenientes, independentemente de laços biológicos ou genéticos. A
Muitiparentalidade é reconhecida judicialmente
e a filiação passa a ser por 4 tipos: procriação natural, adoção,
reprodução assistida ou laços de socio-afetividade.
Outro
avanço: a gestão solidária, desde que sem remuneração, permitido entre pessoas com
vínculo familiar ou afetivo.
Outra inovação diz respeito ao sobrenome
da criança; em Cuba o primeiro sobrenome é o do pai – o que já era parte da
ideologia patriarcal que estabelecia desequilíbrios . Uma vez que a
Constituiçao de 2019 proíbe a discriminação por gênero/ orientação sexual, como
se resolveria no caso do casamento igualitário? Assim sendo, a decisão cabe aos
pais da criança e não mais à lei e aos costumes.
A referida responsabilidade parental que
substitui o pátrio poder, assim como a guarda da criança, pode ser transferida
a terceiros mediante escritura, o que facilita a administração da educação da criança/adolescente
no impedimento dos pais biológicos.
Frente a toda essa transformação que visa
a proteção dos mais fracos na relação familiar, importante ressaltar que o reconhecimento
de direitos das crianças e adolescentes implica no reconhecimento de seus
deveres, em especialde respeito aos familiares e co-responsabilidade no lar.
No que se refere aos idosos, o Código reconhece explicitamente os direitos dos avós pela transmissão de seus valores na formação das famílias. Além disso atribui valor econômico ao trabalho doméstico para quem a ele se dedica, em especial aos cuidadores familiares (idosos e pessoas com deficiência) por sua opção em renunciar a uma vida profissional própria.
O que se pretende demonstrar com esse artigo é primeiramente elucidar alguns aspectos do novo Código das Famílias (projeto) que tem sido vítima de algumas “fake news”.Além disso é a característica de um projeto de lei que deve ser referendado pelo povo cubano, uma vez que se trata de um Estatuto Revolucionário que atende às novas mudanças sociais no planeta. Cuba mais uma vez demonstra estar à frente das mudanças e apresenta ao povo uma norma das mais modernas da atualidade. O fato de ser um país EM Revolução constante é o que permite apresentar esse cuidadoso estudo envolvendo tantos cidadãos para entender que como sempre : “Outro mundo é possível. E necessário”, segundo as palavras do grande Comandante em Chefe Fidel Castro que, certamente, aprovaria este Código pelo bem das famílias atuais ( e futuras)
*Citação do Centro Martin
Luther King, católico, Havana
** O termo Pátrio Poder
tem sua origem na Roma Antiga onde a infância não tinha valor nem direitos, sendo
algumas crianças trocadas ou vendidas por seu “dono”
Fontes: http://cuba.cu/sociedad/2022-02-23/algunas-claves-sobre-el-codigo-de-las-familias/59040
http://www.cubadebate.cu/especiales/2022/08/15/el-codigo-que-merecen-las-familias-cubanas/
http://www.cubadebate.cu/especiales/2022/08/15/el-codigo-que-merecen-las-familias-cubanas/
#Coordenadora do Capítulo
Brasil do Comitê Internacional Paz, Justiça e Dignidade aos Povos e do Comitê
Carioca de Solidariedade a Cuba
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