Exame é obrigatório para reconhecimento de diplomas estrangeiros no Brasil e tem elevado índice de reprovação.
“Sempre estudei em escola pública, além de ser pobre, negro e
sem-terra. Meus pais são analfabetos e em minha família quase ninguém
tem ensino superior. Vivendo naquela condição da roça não podia nem
sonhar em um dia estudar medicina. Conseguir passar no Revalida, tendo
me formado em Cuba, foi uma vitória. Algo muito importante para minha
história”, conta o médico Joelson dos Santos (foto abaixo).
Nascido na cidade de Abaré, na Bahia, Joelson, 28, é filho de
trabalhadores do campo sem-terra, militantes do MST. Incentivado pelo
movimento, decidiu participar da seleção para a bolsa de estudos
destinada a estrangeiros da Escola Latino Americana de Medicina (Elam),
em Cuba.
Para a seleção, foi necessário passar por entrevista com a
embaixadora cubana no Brasil, realizar uma avaliação de conhecimentos
gerais, além de passar um período de seis meses estudando espanhol e a
história de Cuba. Após ser selecionado, aos 19 anos, ele seguiu para o
país de Fidel Castro, onde permaneceu por mais de seis anos.
A
história de Joelson se repete para muitos brasileiros que buscam
estudar medicina em universidades estrangeiras. Muito mais do que a
busca por uma experiência cultural diferente, uma parcela considerável
desse grupo parte atrás de uma oportunidade que não se concretizou em
seu país, seja pela grande concorrência por uma vaga nas instituições
públicas ou pelo preço cobrado pelas faculdades particulares.
Os médicos, brasileiros ou estrangeiros, com diploma no exterior e que
desejam exercer a profissão no Brasil devem passar obrigatoriamente pelo
Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos, expedidos pela
Instituição de Educação Superior Estrangeira (Revalida). O exame tem o
objetivo de reconhecer os diplomas estrangeiros com base nas diretrizes
curriculares nacionais dos cursos de medicina.
O índice de aprovação do Revalida é baixo. Na edição de 2013, por
exemplo, entre os 1.595 inscritos, apenas 155 – menos de 10% –
conseguiram ser aprovados no exame e tiveram seus diplomas revalidados. O
nível de dificuldade do exame é alto, e os médicos formados em
universidades de baixa qualidade têm dificuldade de serem aprovados.
Em 2015, Joelson se submeteu ao Revalida para poder trabalhar no
Brasil. Com a aprovação no exame, o médico sentiu uma mudança no
relacionamento com os colegas e pacientes.
“Sempre que eu me apresentava como um médico formado em Cuba, a
primeira coisa que me perguntavam era se eu estava revalidado ou não. Se
você não estiver revalidado é como se você não existisse como
profissional. É como se todo o seu conhecimento fosse inútil. E quando
você é revalidado, até a relação com outros profissionais muda, agora
você passa a ser respeitado”, comenta.
Filtro
Além de Joelson, pelo menos outros 11 brasileiros formados em Cuba
foram aprovados na edição de 2015 do Revalida. Danilo Araújo, 25, também
militante do MST, foi um deles, e critica o processo de revalida no
Brasil.
Danilo conta que o curso de medicina de Cuba tem a mesma
compatibilidade com o currículo brasileiro, mas por questões políticas,
ideológicas e pela lógica de mercado que a medicina adotou nos últimos
tempos no Brasil, o conselho de medicina impõe a necessidade de passar
pelo exame.
“O processo do Revalida funciona como um filtro. É uma prova
extensa, cansativa e tem muitas pegadinhas. Além disso, tem um índice de
reprovação muito alto, o que faz a gente ficar extremamente estressado
quando se coloca para encarar esse exame. Tudo é feito para dificultar a
revalidação”, afirma.
Apesar da preocupação com o exame, Danilo sempre se sentiu muito bem
preparado pelo ensino cubano e elogia a solidariedade de seus
professores, que cientes da necessidade dos estrangeiros serem
revalidados em seus países, “sempre se mostraram muito compromissados e
dispostos a colaborar no que fosse necessário.”
Neste sentido, a médica Nisselly Barros, 33, outra brasileira formada
em Cuba aprovada pelo Revalida, avalia que o exame “não mudou em nada”
suas habilidades como profissional. Para ela, ele serviu apenas para
conseguir o reconhecimento no Brasil, o que não significa que ela não
fosse suficientemente habilitada antes.
“Eu confiava muito em tudo que aprendi lá. Eu me apaixonei pela
medicina e pela dedicação dos profissionais cubanos na área de saúde. Os
cubanos são muito humanos. Não existe apenas uma relação profissional
entre médicos e pacientes. Eles se colocam no lugar do outro, sentem a
dor do outro”, diz a médica.
Nisselly acredita que é esse tipo de profissionais que o Brasil
precisa. “Em Cuba não existe uma relação hierárquica de poder entre
médicos e pacientes. Isso me impressionou muito. Os médicos da família
conhecem todos os seus pacientes e os tratam pelo nome. É uma relação de
confiança. Há um grande investimento também na medicina preventiva. Lá a
medicina não é um negócio. É o tipo de relação que buscamos ter aqui e
que já melhorou o com o Programa Mais Médicos.”
Fonte: Saúde Popular
VENCEMOS !!! VENCEREMOS !!!
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